O que foi a Expedição Langsdorff
É o nome da viagem de cunho científico, patrocinada pelo Império Russo, no tempo de Alexandre I e Nicolau I, ou seja, no período de 1821-5 a 1829. Seu objetivo era conhecer as regiões pouco exploradas do interior do Brasil, efetuando-se um levantamento da vegetação, fauna, flora, hidrografia, clima, tribos indígenas, e tudo que pudesse acrescentar ao conhecimento dos paises do outro lado do mundo. Além do conhecimento, é de se acreditar que havia interesse comercial nessa investigação. Enquanto era colônia, D. João VI tinha interesse em ampliar o comércio de produtos brasileiros. Daí, talvez, a razão da busca de conhecimentos no roteiro das jazidas de pedras preciosas e do ouro. Mas a vegetação também estava na mira dos estrangeiros. Sobretudo para finalidades de remédios.
Quem era o Barão?
O Barão de Langsdorff, que era o Cônsul Geral da Rússia no Brasil, apesar de ser alemão, gozava junto ao Império Russo, de alto conceito de explorador e viajante. Era médico de profissão, sendo ainda considerado cientista. As representações com os países novos estavam se iniciando e não havia exigências de que fossem naturais da Rússia.
Pois bem, ao que consta, O Barão de Langsdorff visitara o Brasil nos anos de 1813 a 1820, e reconheceu que havia muitos conhecimentos a serem averiguados. Por isso, em 1820, apresentou ao Imperador Alexandre I, um plano para a expedição científica, no que foi autorizado. Seu objetivo seria de expansão de conhecimentos sobre um país novo do continente americano.
A Expedição ao Interior do Brasil
A Expedição iniciou-se já no tempo de D. Pedro I, que em evento recente havia proclamado a independência do Brasil de Portugal. Com a autorização do Império Russo e do Imperador D.Pedro I, a Expedição foi bem recebida por onde passou, recebendo ainda apoio do exército imperial.
A Expedição leva Hércules
A segunda parte da expedição foi consagrada pela história brasileira como uma das mais importantes viagens científicas do século 19. Até então os viajantes e exploradores formavam a massa dos conhecimentos de lugares distantes. E com suas descobertas, os cartógrafos imprimiam novas feições aos mapas. Que por sua vez, alimentavam o imaginário das gerações mais novas com as histórias das riquezas e das civilizações primitivas.
Foi o que ocorreu com o Hércules Florence quando era garoto. Sua mente ficou impregnada pelas histórias dos povos das Índias e das Américas. Leu os livros do Abade-jesuíta Reynal, e Robson Crusoé, de Dafoe. Acrescentou aos seus conhecimentos e imaginação, a leitura dos mapas dos diversos países.
Até que, certo dia, seu desejo de conhecimento e de aventura se tornou realidade.
Durante mais de um século, os conhecimentos sobre a Expedição Langsdorff e seu legado, devia-se à publicação do diário de bordo do jovem francês, que, escrito em língua materna, foi traduzido pelo escritor brasileiro, Visconde de Taunay e publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do Rio de janeiro, ainda no século 19 (1875). Além de Hércules Florence ter a grata satisfação de ver seu feito impresso na Revista do IHGB, ele, justamente por seu feito e por sua narrativa da Expedição, foi convidado a ser membro honorário daquele Instituto.
A Expedição Langsdorff propriamente dita.
Relembrando, era 1825, três anos depois do Brasil se tornar independente de Portugal. D. Pedro I dava os primeiros passos na organização do Governo Imperial brasileiro e prestou todo o apoio á Expedição imperial russa. Um encontro político e científico de bandeiras.
Hércules Florence que havia chegado ao Rio de Janeiro há pouco mais de um ano, foi contratado como segundo desenhista. Outros participantes que formavam um grupo de “inteligência” da viagem foram localizados e contratados. Nem todos foram, mas seguiram com Langsdorff, além de Florence, o 1°. desenhista, Amado Adriano Taunay, o astrônomo da Marinha Russa, Rubtzov, o biólogo Luiz Riedel, entre outros. Sendo Langsdorff estrangeiro, e sendo a Expedição patrocinada pela Rússia, os cientistas e artistas também seriam estrangeiros. Sobraram para os brasileiros, os serviços braçais.
Luiz Riedel, Botânico. Nasceu na Alemanha, em 1790 e faleceu no Rio de Janeiro, em 1861.
Os preparativos da Expedição contaram com a participação do médico e político brasileiro, Francisco Álvares Machado (homenageado com nome de rua no Centro de Campinas), de Porto Feliz, por indicação da família Engler, de Itu, conhecida de Langsdorff. Só restava a partida, que se deu no dia 22 de junho de 1826, de Porto Feliz.
O caminho das águas escolhido pelo Barão de Langsdorff foi por cuidado científico. Por não ser caminho conhecido das outras expedições exploradoras, seus registrados seriam uma grande novidade no mundo científico.
E foram eles, por rios navegáveis, mas não tanto. Tinham que atravessar cachoeiras, seguir rio abaixo, rio acima, rios de muita água, ou em meio à densa floresta.
O trajeto: Rio Tietê, Rio Paraná, R. Pardo (MS), Coxim, Taquari, Paraguai, São Lourenço, Cuiabá. Cuiabá seria um ponto onde as explorações seriam feitas com mais tempo e de forma mais intensa. Foram recebidos pelo Governo no porto da capital, e de início se hospedaram no Palácio do Governo da Província de Mato Grosso. Hércules Florence descreveu esse trajeto assim:
“Afinal, a 30 de janeiro de 1827, após sete meses e meio de viagem e vencidas 530 léguas (3.100km) e 114 cachoeiras, atingiu a comissão científica o suspirado porto de Cuiabá”.
Ficaram cerca de um ano e meio hospedados em Cuiabá para visitar os arredores, como Vila Bela, Fazenda Jacobina, Chapada dos Guimarães, Vila dos Guimarães, Diamantino, tendo Hércules Florence chegado junto à nascente do Rio Paraguai, em Diamantino, o que ele achou extraordinário. Conheceram moradores e índios da região, os quais foram descritos e desenhados pelo artista francês.
A partir de Cuiabá a Expedição se dividiu por decisão do Barão: Riedel e Taunay seguiram viagem pelo Rio Guaporé, para depois navegarem pelo Madeira até ao Amazonas. O plano era que eles aguardassem a outra parte da Expedição em Manaus. Os outros, sob o comando do próprio Barão de Langsdorff, incluindo Florence e Rubtzov, seguiram pelos Rios Preto, Arinos, Juruena e Tapajós, até o Amazonas. Em Santarém deveriam subir o Amazonas até Manaus, quando novo destino seria traçado à expedição. Talvez ir até o alto Rio Negro e Rio Branco, no Amapá.
Entretanto, houve dupla tragédia. De um lado, no Guaporé, o artista Amado Adriano Taunay morreu afogado; e no Juruena, o Barão de Langsdorff perdeu a memória e a saúde, em decorrência das febres. Naquela região do Juruena, Hércules Florence se encantou com o Salto Augusto, fazendo vários desenhos e um mapa da cachoeira. Achou que o Rio Tapajós, já bem próximo de Santarém, tinha mais de largura que muitos rios europeus de comprimento. Conheceu e registrou as características étnicas, culturais e econômicas dos índios Guanás, Guatós, Xamacocos (aculturados), Bororós, Mundurucus, Apiacás. Não chegou a conhecer os Maués, mas em Itaituba, à margem do Rio Tapajós, fez registros de sua participação na economia extrativa, principalmente do guaraná, que Hércules classificou entre as bebidas aromáticas, e que era muito consumida em Cuiabá, e “previu” que um dia seria servida nos botequins de luxo da Europa.
No porto de Gurupá, anotou os produtos que eram comercializados, sendo um deles a borracha. E registrou que obteve informações que alguns produtos eram vendidos sem registros oficiais para evitar os impostos.
Com todos os transtornos, Hércules Florence, que a partir da doença do Barão, no Juruena, ficou no comando da Expedição, enviou mensagem para Riedel se dirigir para Belém (Pará) de onde retornariam para o Rio de Janeiro. Em um barco alugado, navegaram por 45 dias, até que no dia 13 de março de 1829, o barco aportou no Rio de Janeiro.
Estava dada por terminada a missão de Hércules Florence no Brasil?
Um pouco mais de detalhes da Expedição
Patrocinada pelo Império Russo, especialmente por seus Czares Alexandrer I e Nicolau I. O Czar Alexander I teria autorizado a Expedição científica em 1821. Tendo falecido em dezembro de 1825, foi sucedido por seu irmão Nicolau I, que manteve os planos originais da viagem. Foram Czares da dinastia Romanov, integrando o poderoso Império Russo.
Czar Nicolau I (1796- 1855)
O Brasil ainda era pouco conhecido, principalmente nas regiões mais distantes de seu litoral. Despertava enorme interesse de países distantes para novas possibilidades de comércio.
Barão de Langsdorff, cientista e artista, idealizou a Expedição que levou seu nome. Ele era de origem alemã, mas por seus conhecimentos e experiência e conhecimentos do mundo, foi oficializado como representante da Rússia no Brasil, cujo consulado tinha sede no Rio de Janeiro.
A viagem em seu início permaneceria nas regiões Sudeste e Sul. Depois partiria para o ‘interior” do Brasil.
Falaremos da viagem em sua segunda etapa, que ficou mais emblemática na cultura brasileira. Não só pelo fato de que Hércules Florence o segundo desenhista que participou, ter permanecido no Brasil, mas pelas informações vastas e detalhadas que Hércules conseguiu registrar durante todo o roteiro da viagem.
Com toda o recurso financeiro, o Barão de Langsdorff contratou o que havia de melhor entre os estrangeiros que formavam a “inteligência” científica e artística da época. Desenhistas, astrônomo, biólogo, médico, entre outros. Ele próprio, Langsdorff, se encarregaria das anotações com conotações científicas em seu diário de bordo. Os materiais coletados seriam enviados à Academia de Ciências de São Petersburgo, hoje Academia de Ciências de Leningrado. Onde aliás, o material deve estar.
Por mais de um século o material enviado para a Rússia não foi divulgado. No Brasil, todo o conhecimento sobre a Expedição e seus eventos e apontamentos, vinham do diário de Hércules.
Por informações contidas no próprio livro de Hércules “Viagem Fluvial” a escritura do Diário deve ter se processado até, pelo menos, até 1855. Consta que ele encaminhou seus apontamentos ao escritor Visconde de Taunay, que apresentou a proposta de publicação do mesmo na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do Rio de Janeiro (fundado em 1836). Era uma ocasião em que se divulgavam estudos sobre temas brasileiros sobretudo as característica históricas, geográficas e da formação da identidade brasileira. Visconde de Taunay traduziu o diário, que inicialmente recebeu o título de “Esboço da Viagem do Sr. Langsdorff no interior do Brasil”, baseado no título atribuído por Hércules Florence a seu estudo. Por sua contribuição aos estudos do Brasil, Hércules Florence foi nomeado membro honorário do IHGB.
“O que li sob o título - “Esboço da viagem do Sr. Langsdorff no interior do Brasil” - pelo 2o. desenhista da comissão científica, Hércules Florence, não é portanto senão um seguimento de rápidas notas e apontamentos tomados para receberem, em trabalho completo e regular, todo o desenvolvimento desejável; entretanto nisso mesmo achei tanto interesse pela singeleza de narrativa, vivacidade de colorido e prudência de apreciação, que o fui traduzindo desde logo com destino às páginas da Revista do Instituto Histórico.
“... A biografia de Hércules Florence é a narração singela e comovente das peripécias,das descobertas, das viagens, que constituem uma das páginas mais interessantes dos anais contemporâneos”. (E. L. Bourroul, Introdução, pág. X).
“...Hércules Florence era um perfeito desenhista. Temos presentes dois números do Globus, revista alemã publicada em Braunschweig, números de 1 e 7 de janeiro do corrente ano (1900), trazendo curiosíssimos e acabados com minúcia e elegância - desenhos de Hércules, representando, com suma nitidez, pirogas com seus tripulantes, homens, mulheres e crianças indígenas, etc. A estes desenhos tão perfeitos acompanha um estudo de Karl von den Steinen, intitulado Indianerkizzen von Hércules Florence.” E. L. Bourroul, p. 43).
Algumas Narrativas e Retratos de Hércules Florence
Duas Mulheres Bororós
A da esquerda parece ter 40 anos; mostra-se alegre e é um tanto cheia de corpo. Carrega às costas um fardo, que posto em terra era da altura ela.
Esse fardo compõe-se de esteiras, couros, peles enroladas, e jacás cheios de vários objetos, peso enorme para essas infelizes mulheres que são os animais de carga daqueles índios. Tudo aquilo é amarrado com embiras e suspenso por uma faixa mais larga que lhes passa pela cabeça, acima da testa, o que as obriga a abaixarem o pescoço e a fronte, e a curvarem o corpo para diante.
Com tal carga, levam por cima uma criança escanchada nos ombros e um cãozinho. Ainda não é tudo, pois quando os maridos matam um porco do mato ou qualquer outra caça, metem-no num dos jacás que elas trazem às costas.
Mais moça, de cinco pés de altura, robusta e bem feita é a segunda mulher. Tem também sua carga e criança. Em sua fisionomia tristonha e de olhos fixos no chão julga-se quase lobrigar a impressão secular de uma reação lenta transmitida de mães e filhas contra as injustiças dos homens.
“A primeira dessas aves é um belo pássaro do tamanho de uma perua: tem o porte alto, os olhos vermelhos, um colar de penas pretas, além de outro formado pela pele nua. A plumagem é acinzentada, os pés compridos e vermelhos, as asas armadas cada uma delas de dois esporões, com que pode ferir perigosamente. Víamos com freqüência este interessante pássaro, sempre aos pares, quando muito três juntos. O canto que ergue na solidão dos pântanos faz lembrar o som do sino no campo”.
Recomendo que os leitores do blog acessem os endereços abaixo:
Blog da Escritora:
Entrevista cedida pela pesquisadora:
http://www.youtube.com/watch?v=nSlHSRrPKXk
E amostra do belíssimo livro:
http://www.youtube.com/watch?v=ClArr3LhY0s
Com fundo musical de uma canção de Carlos Gomes, "Mazurca".
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